Eutanásia e efeito Placebo

Em artigo anterior publicado no Jornal “Tela Non” abordei o conceito de eutanásia como uma possibilidade para a solução do problema político que o país vive actualmente. Escrevi:

“Eutanásia é o acto de interromper a vida de um paciente de forma intencional para aliviar o seu sofrimento. É um procedimento que envolve considerações médicas, éticas e legais e que é realizado em circunstâncias específicas e com protocolos rigorosos.
Existe uma diferença entre a eutanásia activa- quando se administra uma substância com o propósito de causar a morte e a passiva quando são retirados determinados recursos que mantinham a pessoa viva.”
Pelo visto a demissão do Governo apresenta um caso de eutanásia passiva-quando são retirados determinados recursos que mantinham a pessoa viva.
Apesar de existirem diversas alternativas escrevi ainda:
“O Presidente pode libertar-se praticando a ética da responsabilidade.
Responsabilidade perante o seu povo que clama pelo fim do sofrimento, responsabilidade pessoal usando a honestidade intelectual para concluir que no estado actual das coisas é preciso agir. A ética da responsabilidade exige que se amadureça e pondere as consequências das decisões que tomamos e dos compromissos que assumimos”.
Terá o Presidente da República amadurecido e ponderado a consequências das suas decisões?
O longo processo que se iniciou com as suas sucessivas declarações sobre as taxas aeroportuárias parece indicar que sim.
Mas é preciso ter consciência que esta demissão não resolve os reais e profundos problemas económicos e sociais que o país enfrenta.
A reacção do Primeiro-ministro demissionário que conta com recursos de vária ordem, não para contrariar a decisão, mas para criar uma situação que agrave ainda mais os problemas que ele próprio criou será provavelmente expectável.
Aliás o país está armadilhado para as coisas se tornarem piores. Não tendo negociado um acordo com o FMI, no ano passado, o Governo piorou os termos em que o acordo foi alcançado este ano. Todos os preços vão aumentar: combustível, energia, apertos nos impostos com as consequências que já sabemos. A pouca confiança dos poucos investidores internos e externos vai diminuir pelo menos nos primeiros meses.
Nalguns círculos vai dizer-se que o Presidente podia aguentar a situação. Segundo esta lógica, plena de calculismos interesseiros, o Presidente deveria deixar o Primeiro-ministro “morrer em lume brando” prisioneiro da sua incapacidade de encontrar soluções viáveis e democráticas para o país.
Aliás, não será surpresa se mais uma vez o Primeiro-ministro se vitimar dizendo que mais uma vez foi impedido de implementar a sua “solução”.
Respeito uns e outros mas assumo que o Presidente amadureceu e ponderou tudo isso. As coisas estão tão mal que piorar um pouco mais não tem grandes efeitos.
Mas, a meu ver, a decisão tem um efeito positivo e a esse propósito e somente para efeitos explicativos, invoco um artigo da internet sobre o conceito de PLACEBO.

Placebo é o nome dado à qualquer forma de tratamento médico que parece ser real, mas que, na verdade, não possui nenhuma propriedade química desenvolvida especificamente para causar melhora clinica nos pacientes.
Qualquer coisa pode ser considerada um placebo, contanto que o paciente acredite que aquilo tem propriedades médicas. Um placebo pode ser um comprimido de farinha, uma injecção que só contém água, uma pomada que não contém nenhum medicamento, uma pulseira feita de algum material inerte, luzes, cristais ou mesmo algum aparelho supostamente médico, mas que não faz absolutamente nada, além de acender algumas luzes e emitir barulhos.
O que torna os placebos fascinantes é o fato de, a despeito de não terem nenhuma substância química activa, eles realmente funcionarem para muitas pessoas. Placebos podem aliviar dor, melhorar o humor, tratar ansiedade, aumentar a capacidade de concentração…
Ainda mais interessante é que o mesmo comprimido de farinha e açúcar que pode ter todos os efeitos benéficos acima, também pode causar efeitos colaterais insuportáveis. Basta que o médico previamente forneça uma assustadora lista de possíveis efeitos adversos, para que parte dos pacientes passem a apresentá-los logo após começarem a tomar o comprimido de placebo. Neste caso, o efeito recebe o nome de nocebo.

Em resumo o placebo pode ser ineficaz para tratar directamente a doença, o problema.

A demissão do Primeiro-ministro não cura a doença grave que o país enfrenta. Mas o seu efeito psicológico e político é importante.

Em primeiro lugar afirma inequivocamente que em democracia há limites para o exercício do poder e ninguém pode pretender ser “dono disto tudo” sem respeitar as instituições e os poderes constitucionalmente estabelecidos.
Em segundo lugar pode oferecer a oportunidade para os actores políticos e sociais assumirem as suas responsabilidades. A começar pelo ADI, que continua a ter legitimidade para governar. Por outro lado, os partidos da oposição não podem ver nesta demissão uma oportunidade para chegar ao poder ou ter acesso ao poder. A atitude responsável será apoiar a decisão do Presidente e exercer uma oposição clássica apoiando todas as decisões legítimas e legais do novo Governo e oferecendo colaboração e apoio quando necessário. No ADI há patriotas e gente de bem, disso não duvido.
Outro factor importante e não desprezível, é que talvez se crie um ambiente para que todos nós respiremos livremente, libertos das amarras do medo e exerçamos a nossa cidadania de maneira plena: com liberdade e responsabilidade. Para o bem de São Tomé e Príncipe.